O documento da Aparecida já dizia que como discípulos missionários de Jesus Cristo, necessitarmos sair ao encontro das pessoas, das famílias, das comunidades e dos povos, para lhe comunicar e compartilhar o dom do encontro com cristo, que tem preenchido nossas vidas de ‘sentido’, de verdade e de amor, de alegria e de esperança. (DA 548). Em uma motivação como esta, surgiram as constatações que queimaram os corações de muitos missionários da Consolata no Brasil. A idéia de fazer teologia inserida começou a ser pensada nela.
É preciso entender que o seminário teológico dos missionários da Consolata no Brasil é localizado num bairro da classe misturada; media e baixa. Contanto, os seminaristas fazem a maior parte da sua pastoral na grande favela de Heliópolis nos fins da semana.
O mais importante do que chegar a consensos ou elaborar belos documentos teológicos é que muitos dos missionários se colocarem em discussão e se fortaleça a articulação entre as diversas entidades e grupos nas bases de Heliópolis. Sobre este ponto de vista, é importante para muitos missionários que vêm estudar no Brasil, talvez, mais inseridos nas universidades do que nos bairros populares, entrar em contato com a pobreza terrível de Heliópolis, barracópoles perante as quais as favelas mais pobres do sul do país parecem bairros de luxo. Ali, encontramos missionários, religiosos e leigos, que mesmo sem elabora uma teologia sistemática, vivem o que os primeiros teólogos da libertação propunham. Habitam em meio à favela e dão suas vidas aos crucificados de hoje. São pobres no meio dos pobres. Vendo tudo isso podemos lançar a pergunta: que tipo de formação queremos como missionários da Consolata e da igreja hoje? Conforme Jon Sobriño, teólogo da latina America, a igreja católica continua tentada à heresia do docetismo, isto é , do desligamento da realidade.
Em muitos lugares, a igreja continua mergulhada em um sono dogmático. É preciso passar para a ação concreta. Ao não assumir claramente um compromisso de solidariedade com os povos que Jon Sobriño denomina de crucificados do mundo, a igreja mostra que ainda não se converteu ao chamado de Jesus de seguir no caminho da cruz. Não se trata de canonizar a pobreza como virtude, nem de idealizar os pobres como se fossem todos bons e justos e sim de denunciar a postura e as atitudes de acabar com a vida do povo. Ao menos , cada formação, cada cristão e mais ainda, cada missionário/ia , deve testemunhar que não existe espiritualidade sem a solidariedade, e não existe teologia sem a defesa da vida e na comunhão com as vitimas deste mundo iníquo.
Era urgente pensar sobre uma formação inserida dos missionários do Brasil, para não ser, contraditórios ao nosso chamado. Como não se preocupar com isso, ao se ler os documentos preparatórios para a 5ª conferencia geral do episcopado latino-americano em Aparecida do norte (maio 2007) e se deparar com uma igreja católica ainda, por demais, voltada sobre si mesma?
É claro que a luta contra a pobreza não pode repetir os métodos dos primeiros tempos da teologia da libertação. O desafio é que as nossas teologias contextuais não se restrinjam a pesquisas de teses especializadas e não se isolem em guetos específicos. Elas são chamadas a se inserir na caminhada maior do povo mais pobre e a participar da grande caminhada por um novo mundo possível para todos. Podemos afirmar do que Rowan Silva dizia, que se não estivermos dispostos a pagar o preço de nos colocarmos do lado dos pobres, a nossa teologia é inútil.
Dá-se então o contrario do que era dantes. Quanto mais versamos os modelos, penetramos os volumes do gosto da teologia, compreendemos a extensão da responsabilidade, tanto mais se nos acanham as mãos e o espírito, posto que isso mesmo nos esperte a ambição, não já presunçosa , senão refletida. Esta não é talvez a lei dos anjos a quem a natureza deu o poder quase inconsciente das supremas audácias, mas é, penso eu, a lei das aptidões médias, a regra geral das inteligências mínimas.
Chegaram já a esse tempo, dois dos nossos missionários estudantes, Jacques Kwangala Mboma do Congo e Gian Lucas Pinta da Itália. Os dois estão estudando a teologia no ITESP. Gratos às afáveis palavras com que povos e missionários benévolos lhes têm animados, chegaram a começar a fazer a teologia inserida na favela de Heliópolis. Heliópolis é a maior favela da cidade de são Paulo e é composta por 14 glebas, e possui aproximadamente 100 mil habitantes e tem uma área de quase um milhão de metros quadrados. Esta favela é localizada na região do Ipiranga, zona sul de são Paulo.
Desde dia 21 de abril de 2009, os dois seminaristas procuram conhecer melhor o agro destas tarefas missionárias nobres e consoladoras, é certo, mas difíceis quando as perfaz a consciência. Com tudo, o objetivo é formar um missionário inserido na realidade do povo: o povo modela um pastor do seu gosto. E o povo latino americano procura modelar um pastor que faz e vive a opção dos e com os pobres.
Para os nossos irmãos, digamos coragem sem duvidas que este é o caminho. Sempre temos que pôr em ação aquele pensamento de Shakespeare:
“Our doubts are traitors, and make us lose the good we oft might win, by fearing to attempt.”
Não quis fazer um discurso de justificação, mas uma reflexão de que é possível fazer teologia na metodologia da teologia da libertação e inserida na comunidade dos ‘crucificados’. Só um pouco de coragem no senhor – Is. 41,6. É o que peço a Deus com o coração nas mãos. Assim cantaremos com Beth Carvalho: Eu só peço a Deus.
Eu só peço a Deus
Que a dor não me seja indiferente
Que a morte não me encontre um dia
Solitário sem ter feito o que eu queria
Eu só peço a Deus
Que a injustiça não me seja indiferente
Pois não posso dar a outra face
Se já fui machucada brutalmente
Eu só peço a Deus
Que a guerra não me seja indiferente
É um monstro grande e pisa forte