"Ntawe utera ibuye aho yajishe igisabo”
A epistemologia deste ditado ruandês acima é mais apropriada se pensarmos em falar sobre meio ambiente. Significa que “continuamos a atirar pedras contra o nosso bem mais precioso, contra o que nos sustenta, a nossa, “casa comum". Segundo esse ensinamento, a terra não é algo aparte da gente, mas nós somos terra. E a terra antes de ser um bem econômico, é um dom que fomos emprestado.
Assim como o papa Francisco fala na encíclica “Laudato Si”: "crescemos pensando que somos os proprietários e dominadores da terra, autorizados a saqueá-la. (...). O aquecimento global é consequência do nosso esquecimento de que nós mesmos somos terra. Inclusive, o nosso corpo é constituído pelos elementos do planeta: o seu ar nos permite respirar, e a sua água nos restaura e dá a vida. A floresta que nós fornece madeira, papeis e serve templo dos ritos”
De modo geral, a maioria dos estudos sobre mudança climática e crises ambientais foi (são) produzida ou liderada pelo universo ocidental, muitas vezes unilateral, sem um abordagem multidisciplinar e dialogal. Por essa razão, nos unimos a outros teólogos e pesquisadores como Laurenti Magesa, tanzaniano, para afirmar que a espiritualidade & religiosidade africana[1] pode oferecer uma contribuição, uma ética alternativa em face de crises ecológicas, espirituais, econômicas sem precedentes.
A ecologia representa uma nova fronteira para a ética teológica. Por isso, dada a complexidade da questão, é necessário que as diferentes crenças e áreas regionais aprendam umas com as outras. Não há indivíduo, disciplina ou comunidade que afirmes ter todas as respostas. O que está claro é que a crescente destruição do meio ambiente e biodiversidade é em grande parte atribuída à atividade humana. E há principalmente, multidões de pobres, homens e mulheres, que permanecem sob os escombros de um planeta em colapso. A tecnociência sozinha não é suficiente.
ESPIRITUALIDADE AFRICANA
Quais são os recursos presentes na espiritualidade africana para enfrentar essa degeneração? Em poucas palavras, a espiritualidade africana lembra aos seres humanos que a criação é essencialmente sagrada. Para muitos africanos, há uma relação nítida entre o mundo racional, física, biológica e espiritual[2]. É uma combinação integrada e integradora de um sistema de crenças com os padrões de comportamento. Em outras palavras:
Homo africanus sees life as a unity of soul, mind, psyche, senses, vitality, cosmic forces, mystical energies and body relationships, encompassing both the physical and the metaphysical domains.
Em nosso mundo ocidental, e a sua filosofia e religiosidade, para se modernizar, foi racionalizada demais. E, em vez de gerar sentimentos acolhedores, de ajuda e abraço aos outro seres, dando-lhes um sentido de dignidade não ligado a dinheiro ou ao poder, desperta, não raro, as tentações do rancor, ganancia e acumulação infinita dos bens. Tudo isso, afeta a própria concepção do homem. “O homem não é apenas uma liberdade que se cria por si própria. O homem não se cria a si mesmo. Ele é espirito e vontade, mas é também natureza” (Laudato Si p 7).
Para a religiosidade africana, amalgamada no Brasil com elementos do cristianismo e das crenças indígenas, a vida tem os encantos, belezas e sensações da natureza onde os mortos não foram para sempre, mas continuam vivos, ao nosso lado, protegendo-nos e guiando-nos. Como escreveu o poeta senegalês, Birago Diop: “Aqueles que morreram não estão longe, estão na sombra espessa. Os mortos não estão embaixo da terra; estão na árvore que retumba. E estão no bosque que geme. Estão no incêndio que se acalma, estão na grama que chora, estão nas rochas que gritam, estão no bosque, no lar. Os mortos não estão mortos”.
No mundo cada vez fragmentada, desarticulado, devemos passar do consumo ao sacrifício, da avidez à generosidade, do desperdício à capacidade de partilha, em uma ascese que “significa aprender a dar, e não simplesmente renunciar. O povo afro vêm uma estreita interligação entre florestas, vida e etno-medicina[3]. Segundo o Prof. Ali Mazrui (1986), uma floresta, terra fornece para o ser humano “todas as necessidades básicas” - comida, materiais para construir uma casa, medicina e chuva; Ele também fornece um santuário para práticas religiosas como bem e um lar para o fugitivo; além disso, serve como cemitério e a morada dos espíritos ancestrais.
O ser humano tem procurado se auto realizar, sentir-se satisfeito com o que conseguiu fazer de si. Para chegar a tal, precisa encontrar a harmonia entre sua mente e espirito e a dimensão física. Alcançar esse equilíbrio é desafiador, uma vez que o mundo moderno continua a desarticular a relação entre o corpo e o espirito como se eles pudessem coexistir de maneira independente, quando a experiência de viver é um fenômeno integrado.
A espiritualidade nós ensina enxergar o mundo na sua unidade global e original, portanto, gerencia equilíbrio e terapia. Isso é ter uma vida simples e amigável com meio ambiente. O jeito como o mundo está andando não pode continuar porque se baseia numa ideia de que o crescimento pode ser infinito, quando a gente sabe que mora num mundo mortal, com recursos finitos.
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[1] A reflexão africana sobre Deus, não começa exatamente com a ideia de Deus (especulação, com noções mentais ou filosóficas de Deus), mas com a experiência da vida, ou, melhor ainda, com Deus percebido na vida e em relação a ela em geral ou na vida humana e em relação a ela em particular. Aqui na vida a auto manifestação de Deus se faz evidente, já que a espiritualidade africana sempre acreditou que o que Deus mais deseja para a humanidade é a “intensificação da vida na comunidade”. (LAURENTI MAGESA)
[2] Essa visão holística da pessoa deve ser resgatada. Nós somos (ocidentais) herdeiros de uma determinada visão sobre a corporeidade, em parte suspeita, mas também negativista, dualista, minimalista. Em resumo, poderíamos dizer que durante muitos séculos a mentalidade religiosa geral considerou o corpo “como se fosse a doença da alma”. Em consequência disso, foram feitos ingentes esforços para anular totalmente o corpo e para negar qualquer valor á corporeidade, não só à sexualidade ou ás coisas “carnais”. A vida crista se resumia quase exclusivamente á espiritualidade da alma, ao invés de ser uma espiritualidade da pessoa na sua unidade global, dinâmica e conflitiva (ROCCHETTA, 1990)
[3] Existe o ditado no linguajar “bantu” que disse; “Tunza nikutunze” significa que, “cuida a natureza e ela cuidará de volta”. Homo conservator needs move from a culture of having to a culture of being, to consume less, share more, and live more simply so that the planet may simply live.