No Estado do Tocantins, nos últimos cinco meses, morreram 15 crianças do povo Apinajé. No Mato Grosso do Sul, morreram dezenas de crianças Guarani-Kaiowás devido à desnutrição. No Pará, sete crianças do povo Munduruku morreram vítimas de infecções intestinais. No Amazonas, observa-se um descaso nos serviços de saúde e o alastramento de doenças infecto-contagiosas. Em Roraima, entre os Yanomamis, os índices de malária voltam a preocupar. No Acre, 10 crianças Kaxinawás, do Alto Juruá, morreram em conseqüência da diarréia. Nos Estados do Sudeste e do Sul, foram registrados dezenas de casos de desnutrição em crianças Guaranis e Kaingangs, na sua maioria vivendo em pequenas áreas de terras devastadas pelo processo colonizador. No Mato Grosso, morreram crianças Xavantes, da terra indígena Marawatsede. Esta área, já demarcada e homologada, continua fora do domínio do povo Xavante, invadida por fazendeiros da região.
No Brasil, o órgão responsável pela assistência à saúde indígena é a Fundação Nacional de Saúde (Funasa). Em muitas regiões esse órgão é manipulado por parte de grupos políticos que o transforma em instrumento de alianças para perpetuar o poder. As denúncias sobre as graves deficiências na gestão da saúde indígena são inúmeras em todo país. Sem dúvida, essa situação de calamidade está relacionada com a questão da posse da terra.
Há 250 anos, no dia 7 de fevereiro de 1756, o líder Guarani Sepé Tiaraju foi morto numa batalha no sul do Brasil entre o povo Guarani que vivia nas reduções jesuíticas e os exércitos da Espanha e de Portugal. Três dias depois, outros 1.500 Guaranis foram assassinados. “Alto lá! Essa Terra tem dono”, gritou Sepé Tiaraju vendo a invasão na terra do seu povo. Ele a reivindicava como uma terra partilhada e respeitada. Ainda hoje, a questão da terra é central na luta de resistência dos povos indígenas.
No tema da Semana dos Povos Indígenas, que acontece no mês de abril desde 1986, ecoa mais uma vez o grito de Sepé Tiaraju. Este ano a Semana acontece de 16 a 23 de abril e será marcada com vários eventos pelo país. Para os povos indígenas, a terra sempre foi sagrada, coletiva, “Pátria Grande”, mãe. Mãe não se vende, não se troca, não se divide. Essa idéia original entra em choque com a concepção de propriedade privada, herdada do velho continente. A Constituição brasileira de 1988 assegura aos povos indígenas o direito ao uso das terras historicamente por eles habitadas. Mas, o latifúndio não pára de avançar. Quando alguma etnia reivindica seus direitos, o Poder Judiciário não demora em expedir mandatos de reintegração de posse. E quando surgem os conflitos, a mídia reforça a idéia de que a ordem deve ser mantida a qualquer custo. Explorando o emocional, a reportagem vai fazer você e eu ficarmos do lado do capital, do latifúndio e do agronegócio. Os que reagirem com qualquer tipo de protesto, são “violentos e bestiais”, gente estúpida que não conhece as leis e não sabe que a ordem deve ser cumprida. Mas os povos indígenas continuam afirmando: “Alto lá! Essa Terra tem dono”.
Jaime Carlos Patias, imc, mestre em comunicação e diretor da revista Missões.